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sábado, 11 de junho de 2011

Cidade Canção

Quando os desbravadores chegaram na região de Maringá e começaram a derrubada da mata virgem para construir a cidade, eles entoavam a famosa canção “Maringá”, de Joubert de Carvalho, um sucesso dos anos 1930. Quando a Companhia de Terras Norte do Paraná precisou batizar a cidade, Elizabeth Thomas, mulher do diretor da companhia Arthur Thomaz, ouviu a canção entoada pelos desbravadores e sugeriu batizar a cidade em homenagem a música: Maringá.

Nos anos 1960, quando o ex-vereador e presidente da Associação dos Pioneiros de Maringá Antenor Sanches trabalhava no gabinete do prefeito João Paulino Vieira Filho, recebeu uma carta de uma estudante de Minas Gerais que pedia mais detalhes sobre a história “da cidade que nasceu de uma canção”. A colocação foi tão sugestiva que gerou uma campanha, e a alcunha “Cidade Canção” foi adotada oficialmente. Mas o que isso tem haver com a feira?

A canção está em todos os lugares. Na Feira do Produtor, a música se faz presente pela voz e violão de José Bonfim Batista, que já canta no local há mais de 30 anos. Um cantor de feira, com um caixote e um violão, entoando modas de viola para o público à frente de uma caixinha, onde o público deposita moedas. Propositalmente, deixo a parte mais emocionante para o final: Bonfim tem uma doença hereditária chamada retinose pigmentar, que aumentou gradativamente o grau de cegueira do cantor até a perda total da visão.

Aos 21 anos, quando já não enxergava, aprendeu a tocar violão e não paro mais. Conseguiu gravar até mesmo CDs, que deixa à mostra na feira e, ocasionalmente, vende um ou outro. A assiduidade na feira é inconstante também para Bonfim. A mecânica da Feira do Produtor, onde os feirantes obedecem à sazonalidade, parece servir até mesmo para o músico. No entanto, quando está lá, próximo à barraca de pastel mais movimentada da feira, e não hesita em contar sua história de vida, entre uma canção e outra.

Quando o conheci, no ano passado, foi debaixo de uma fina – porém incômoda – chuva de verão. Imagino que ele nunca tenha ouvido falar em “Cantando na Chuva”, um clássico dos anos 1950, mas a cena imediatamente me remete ao filme. Mesmo na chuva, lá está Bonfim. Um guarda-chuva aberto e preso aos pés, as mãos livres para manejar o violão, mostrando para quem quisesse ouvir que para a música não há tempo ruim. Ao contrário do roteiro do filme, que foi escrito após a escolha das músicas que fariam parte da obra, Bonfim parece “escrever” o repertório na hora.

Afinal, acho que descobri o que me encanta na feira. Não se trata apenas da qualidade dos produtos, da procedência, dos quitutes ou do saudosismo dos meus tempos de moleque serelepe que ia escorregar no morro do Willie Davies e comer um pastel com meu avô. Afinal, acho que a feira atrai pela riqueza de personagens e histórias que podemos encontrar, conhecer, desvendar. No fim, se trata de “conhecer pessoas”.

Quer saber por que vale a pena ir em busca dessas histórias? Vou explicar de forma metafórica, o mais próximo que posso no momento, mas não garanto que você vá entender, a menos que você seja (ou se recorde como é ser) uma criança na fase do “por que?”. Quando perguntaram ao alpinista britânico George Mallory o motivo de ele querer escalar o Monte Everest, em 1924, ele respondeu simplesmente: “Porque está lá!”. Afinal, precisa de mais alguma coisa?

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